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Segurança alimentar para o futuro - artigo de Emile A. Frison e Israel Klabin

Por Emile A. Frison e Israel Klabin

Quem conhece a ONG La Paz on Foot, na Bolívia, talvez não saiba de seu forte envolvimento com uma iniciativa que vincula ecoturismo e agricultura. Desde 2007 a ONG Proinpa, a cadeia de restaurantes Alexander Coffee e a Bioversity International têm trabalhado juntas para explorar as oportunidades de agroturismo em Santiago de Okola, uma pequena comunidade rural à beira do Lago Titicaca. A ideia era testar como o agroturismo poderia ser usado para gerar subsistência sustentável para comunidades locais fortemente afetadas pela migração de jovens. O Lago Titicaca, localizado a 4 mil metros acima do nível do mar, é um importante ponto de diversidade de onde grãos alimentares andinos, como a quinoa e o cañihua, são originários.

A aliança estratégica idealizada pela Bioversity International possibilitou aos parceiros trabalhar juntos e encontrar novos mercados para diversas lavouras tradicionais que estavam desaparecendo. Como parte do trabalho foram organizadas feiras de agrobiodiversidade e excursões ao campo para turistas com o objetivo de entretê-los e mostrar a diversidade dos grãos andinos e a rica cultura alimentar a eles associada. Além disso, uma infraestrutura simples foi montada para atender os turistas com desejo de pernoitar no local. Agora os visitantes percorrem o vilarejo para conhecerem lavouras indígenas e a cultura relacionada. As pessoas estão ganhando dinheiro com a hospedagem, o passeio às lavouras e a venda de alimentos. A parceria com o restaurante ajudou a vincular os produtores aos mercados para levar os produtos ora negligenciados a cidades grandes, como La Paz.

Como resultado dessa iniciativa, a comunidade testemunha um aumento na renda, a inclusão social de pessoas marginalizadas e a conservação da biodiversidade indígena e do conhecimento local. Esse é um exemplo de agricultura alinhada à conservação, conectada pela biodiversidade agrícola, que é a base da vida na Terra, embora esteja sob ameaça.

A região com maior biodiversidade é a Amazônia, que contém cerca de um terço das espécies de animais, plantas e micro-organismos do planeta, milhões de hectares de floresta densa, milhares de quilômetros de rios sinuosos, que compõem a vasta Bacia Amazônica. O desafio é manter uma relação harmoniosa entre o homem e a natureza.

A Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável (FBDS), organização sem fins lucrativos, propôs o Zoneamento Econômico-Ecológico da Amazônia, um projeto para determinar a gestão dessa região, que representa metade do território brasileiro. Reconhecida como uma das principais instituições do Brasil que promovem práticas ambientais e de sustentabilidade, a FBDS queria aprimorar as ferramentas que pudessem propiciar melhor qualidade de vida para a população local, respeitados os condicionantes ambientais.

Para começar, foi elaborado um diagnóstico inicial reunindo informações sobre agricultura, florestas, conservação de biodiversidade, energia, transporte e geopolítica. Em seguida, foi realizada uma pesquisa para coletar dados sobre geologia, solo, vegetação, sistemas rodoviários e hidrografia. Com essas informações técnicas foi desenvolvido um banco de dados georreferenciado altamente especializado. Esse banco de dados agora atua como uma ferramenta técnica e científica essencial para direcionar o desenvolvimento econômico-social da região, minimizando os impactos ambientais e tentando corrigir os erros do passado.

Esses exemplos positivos mostram que é possível coordenar objetivos econômicos, sociais e de conservação. É tempo de recriar as lavouras como ecossistemas produtivos, saudáveis e resilientes, que conservem a diversidade dentro de uma ampla paisagem provedora de alimentos.

Também é tempo de dar um passo à frente nessa relação. Precisamos encontrar formas de incluir ambos os objetivos nos cenários agrícolas. Precisamos do compromisso de parceiros e financiadores rumo a uma visão comum. E precisamos que tomadores de decisões repensem as políticas que separam as agendas de agricultura e conservação.

Os principais atores desses setores estão começando a reconhecer a contribuição crítica da biodiversidade para a subsistência humana. Com mais pesquisas podemos mostrar como proteger a biodiversidade e usá-la para contribuir para uma agricultura resiliente e multifuncional, que atenda às metas de produção de alimentos, de restauração do ambiente e preservação. E que atenda também aos aprimoramentos da subsistência nos cenários agrícolas.

Formadores de opinião de organizações agrícolas, de conservação e com experiência de mercado reuniram-se no Rio este mês para apoiar um novo paradigma em agricultura e desenvolvimento sustentável. Como parte do Consórcio CGIAR (Consórcio dos Centros de Pesquisa Internacional de Agricultura), a Bioversity está desenvolvendo um modelo de pesquisa em agricultura com pequenos produtores e parceiros que maximiza tanto os objetivos de sustentabilidade agrícola quanto os de produtividade e conservação, tendo a biodiversidade como ponto de conexão principal.

Nossa visão comum é um sistema agrícola global que atenda à demanda crescente de produção de alimentos e serviços de ecossistema sustentáveis, diante da mudança climática. Isso é fundamental para as regiões do mundo onde as populações dependem da agricultura e de ecossistemas para sua subsistência e precisam urgentemente de segurança alimentar.

A cooperação entre os setores é de crucial importância para enfrentar os desafios globais compartilhados e pôr a conservação e o uso da biodiversidade no centro das atenções ao lidar com problemas importantes como segurança alimentar e nutricional, mudança climática, saúde humana e pobreza.

* Diretor da Bioversity International e presidente da Fbds, respectivamente

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